21 de jan. de 2012

SABEDORIA CONTRA A INTOLERÂNCIA



21 de janeiro é o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa. A data foi oficializada pela Lei nº 11.635, sancionada pelo ex-presidente Lula. Essa data marca a morte de Gildásia dos Santos, a Mãe Gilda, ialorixá do terreiro Axé Abassá de Ogum. A líder religiosa morreu, em 21 de janeiro de 2000, numa situação de combate contra a intolerância religiosa praticada por evangélicos em seu templo, localizado no Abaeté, em Itapuã, na Bahia. Sofrimento pode gerar conhecimento e quem mais sofre intolerância pode nos dar lições de como enfrentar o problema. Vamos escutar, então, o Povo de Santo!

Nós já comentamos aqui no blog a beleza do concerto/espetáculo Alabê de Jerusalém, onde o cantor e compositor Altay Veloso lança uma mensagem macro-ecumênica contra a intolerância religiosa, o preconceito racial e tantas outras diferenças que ainda provocam conflitos entre a gente. É, ao mesmo tempo, a mais pungente obra de sincretização e/ou inculturação do evangelho cristão no universo afro-brasileiro. O Alabê, entidade espiritual, manifesta-se num terreiro de umbanda, narrando o que se passou com ele há dois mil anos, quando conheceu Jesus na Palestina. A mensagem do Nazareno é então atualizada e regionalizada pros brasileiros de hoje. Nestes tempos em que vivenciamos fatos lamentáveis de intolerância e incompreensão em nossa cultura (veja aqui notícias de dificuldades das tradições espirituais conviverem no país laico da gente), voltamos à sabedoria do Alabê (no vídeo acima e no texto abaixo) pra ouvir o que ele diz sobre "Os intolerantes"...

"Ah, meu Deus! Assisto com muita tristeza a pena da aspereza dilacerando a beleza de uma linda sinfonia. A aguarrás de juizes, ciumentos inflexíveis, descolorindo as matizes de uma linda pintura, só porque não gostam da assinatura? E vai com uma bailarina, com a inocência de menina, dançando em volta do sol, a Grande Mãe Terra. Enquanto muitas nações, governos, religiões ensaiam a dança da guerra. Na verdade a bola azul quase nunca foi amada; é sempre penalizada. Tem um trabalho enorme, dedicação e talento para preparar a mistura, juntar os seus elementos para dar forma às criaturas, e elas, depois de paridas, desconhecem a matriarca e dizem, mal agradecidas: que a carne é fraca."

"E quando o planeta gera um Avatá, um iluminado assim como o Nazareno, tem logo quem se apresenta com conhecimento profundo e diz logo: não é desse mundo, só pode ser extraterreno. Ah, é difícil entender porque é que o homem, até hoje, cospe no prato que come. Algumas religiões, não sei por qual motivo, dizem que a Terra é um território com vocação pra purgatório, não passa de sanatório... E que nós só seremos felizes longe dela, bem distante, lá onde os delirantes chamam de paraíso."

"Olha, eu vou dizer de coração. Na minha simples andança, dia após dia, me perdoem a liberdade, mas religião de verdade, mais parecida com a que Jesus queria, talvez seja sentimento de ecologia. Para esse sentimento não tem fronteiras e só reza um mandamento: preservação das espécies com urgência, sem adiamento. Hoje, ela pensa nas plantas, nos rios, no mar, nos bichos. Amanhã, com certeza, com a mesma dedicação e capricho, pensará com muito cuidado nos meninos abandonados. Ah, se ela tivesse mais força para sustentar sua zanga, evitaria, com certeza a fome cruel de Ruanda. Não tinha maturidade, ainda era uma menina, quando a impertinência sangrou, com a bola de fogo, a pobre Hiroshima. Mas ela cresce, se instala como uma prece no coração das crianças. Tenho muitas esperanças..."

"Eu tenho toda a certeza que nosso planeta um dia, mesmo cansado, exausto, terá toda a garantia e guardado por uma geração vigia, nunca mais verá a espada fria no Holocausto. A intolerância, repito, é a mais triste das doenças. Não tem dó, não tem clemência. Deixa tantas cicatrizes nas pessoas, nos países, até as religiões, guardiãs da Luz Celeste, abandonam seus archotes para empunhar cassetete. E o que, na verdade, refresca o rosto de Deus, é um leque, que tem uma haste de Calvino e outra de Alan Kardec. Na outra haste, as brisas, que vêm das terras de Shivas, são uma, dos franciscanos, e outra, dos beduínos. Não precisa ir muito longe... Jesus nasce entre os rabinos."

"Às vezes corações que crêem em Deus, são mais duros que os ateus. E jogam pedra sobre as catedrais dos meus deuses Yorubás. Não sabem que a nossa terra é uma casa na aldeia, religiões na Terra são archotes que clareiam." (Altay Veloso).

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Baixe também aqui a Revista Ciberteologia
sobre "Religião.violência e suas interfaces".

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