27 de nov. de 2009

O ENCOURADO E A COMPADECIDA

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Em meio às amarguras da existência acontecem surpresas... Mas por esta ninguém podia esperar! Gisela e Benno Lermen formam um casal especial na vida de muitos que agora são tidos como mestres na UNICAP e, especialmente, em nosso Mestrado. Eles trabalharam no Recife nas décadas de setenta a noventa, exerceram magistério e coordenação no Centro de Teologia e Ciências Humanas desta Universidade, foram professores e colegas da gente. Sobretudo, são juntos um testemunho de firmeza e delicadeza, que tentamos encarnar e transmitir às novas gerações de teólogos e pesquisadores da religião que a Católica de Pernambuco está formando.

Pois bem, agora, lá do seu sagrado refúgio gaúcho de São Leopoldo, eles estão acompanhando, através deste bloco de notícias, as nossas incursões na pós-graduação por aqui. E com interesse quase paternal, Benno escreveu-nos uma missiva virtual (e-mail, pros mais novos!): “... Fiquei pasmo com a enorme criatividade que estão desenvolvendo no trabalho acadêmico. E, lá dentro, eu também me sinto realizado”.

Tem mais: não deixou escapar, no blog, nem a aparição do nosso bode (que já está quase virando o mascote do Mestrado): “Quando vi a foto da(do) cabra/bode que veiculaste como chamada para as Ciências da Religião da UNICAP, envolvendo o Ariano Suassuna no raciocínio, quase levei um choque. Entre os muitos ‘cabras da peste’ de quem me aproximei por empatia/simpatia, está o Ariano. Lembrei-me que - já em 1959 - cinquenta anos atrás, participei na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Cristo Rei, de São Leopoldo, duma encenação do Auto da Compadecida. Fiz o papel de um personagem bem brabo - o Encourado. Para curiosidade, anexo três fotos da época. Como vês, aos poucos, vou descobrindo como o ‘destino’ foi trabalhando para levar-me, mais tarde, para o Nordeste...”.

Bendito “destino”, então, que uniu Benno e Gisela, e bendita a liberdade que os trouxe ao Nordeste e às nossas vidas, para ajudar a reescrever - com tintas misturadas da douta filosofia e da santa comédia - a cultura religiosa de muita gente nessas plagas (que, não fosse a presença do casal, continuaria rezando incelença e cantando cordel - sem nem saber por que razões e da possibilidade de outros tons). Bendito, enfim, o belo “fruto” que levaram daqui, uma “abelhinha olindense”, “terceira incluída” entre e além, desse "cabra da peste" e da sua “compadecida”. Eles ensina(ra)m, também com muitos testemunhos de retidão e de acolhimento (além, até, da arte da apicultura cultivada por Benno), que a vida pode ser mais doce...

E Ariano vai ficar contente quando souber que, com os seus bodes e encourados, entrou nessa história também. Aliás, ele até merecia título de teólogo honoris causa, pois resgata a fé popular mas lhe tira o tom carrancudo de Deus através das brincadeiras de Quaderna, das intervenções de Nossa Senhora. Até com o Diabo/Encourado ele brinca e integra como joguete no Tribunal Celestial dos sertões. Ariano dota a nossa cultura simples de uma dimensão erudita, crítica e universal – sem deixar de ser lúdica e brincante. Ele recupera das cantorias a veia religiosa da nossa gente, mas amplia a consciência das suas contradições através de elementos picarescos e satíricos. Revolve o catolicismo popular e procura por dentro os mecanismos que lhe permitem o desenvolvimento humanista. Benno e companhia aprenderam e potencializaram essa lição!



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